A morte do blog

Quando eu mantinha ativamente este blog eu costumava me lembrar sempre da máxima: “blog parado é blog morto”.

Pois bem, como muitos já perceberam (a última postagem foi há mais de 2 anos), este blog está morto. Eu mesmo já nem lembrava mais que ele existia. Portanto, o fito da presente e breve postagem é apenas oficializar o óbito.

As razões para a morte são muitas:

Primeiro, eu me afastei da biologia para seguir outra de minhas paixões, a visualização de dados. Atualmente eu sou um programador especializado em criar gráficos interativos… se você quiser saber o que eu faço, dê uma olhada no meu site.

A segunda razão é, provavelmente, a mais comum para que escritores abandonem um blog: o trabalho é enorme e cansativo (especialmente se o blog é um “líder” na área), demandando bastante tempo e dedicação… porém, o retorno financeiro é virtualmente inexistente. Eu nunca ganhei nada — financeiramente — escrevendo estes posts (a não ser um exemplar de um livro, em troca de um anúncio na barra lateral). Imagino que alguns irão dizer “mas o importante é a dedicação, o empenho de popularizar a ciência, e não a preocupação com essa bobagem que é dinheiro…”. Infelizmente eu discordo: defendo o reconhecimento do trabalhador e do seu trabalho, especialmente o artístico e o científico. Mais ainda agora, que tenho uma boca mirim para alimentar! Produtores de conteúdo de qualidade na internet (sejam textos, vídeos, imagens etc…) deveriam ser bem remunerados. Porém, a dinâmica do mundo online é outra, como todo mundo sabe.

Além dessas há outras razões menores, não diferentes das que fazem a maioria dos blogs morrerem.

Finalmente, agradeço a todos os que acompanharam o blog durante todos esses anos. O meu trabalho é dedicado a vocês.

Abraço a todos.

Eu e a psicanálise

Estava um dia desses relendo meu livro, procurando por erros de português — que, como uma maldição, parece que se multiplicam entre uma revisão e outra — quando me ocorreu algo sobre o qual nunca havia pensado. O título do meu livro é uma clara referência ao título de um livro de psicanálise, como eu explico na introdução. Acontece que, ao saber disso, o leitor pode achar que eu gosto ou mesmo que eu defendo a psicanálise, e isso está longe de estar correto. Continuar lendo

O doodle e a marcha

O Google publicou, recentemente, um doodle em homenagem ao 41º aniversário de descoberta de Lucy, o famoso fóssil de Australopithecus afarensis. Ao que parece, o doodle irritou algumas pessoas impermeáveis às ciências. Quando o Google fizer um doodle sobre Copérnico os defensores do geocentrismo também deverão se irritar, e quando o doodle for sobre Pasteur os defensores do movimento antivacinação irão protestar. Bem, eu também não gostei muito do doodle, mas por uma razão diametralmente oposta! Continuar lendo

Sobre o óbvio

Quando pensamos nos gênios que a humanidade teve a honra de ver surgir nos últimos mil anos, é difícil não vir à mente a figura barbuda de Galileu Galilei. Entre suas várias realizações está a solução para o problema do movimento, solução essa que atualmente conhecemos pelo nome de inércia e que foi formalmente descrita algum tempo depois por Newton em seu Philosophiae Naturalis Principia Mathematica. Convém lembrar que, poucas páginas após descrever a lei da inércia, Newton afirma que foi Galileu quem a descobriu, aparentemente uma das poucas passagens no Principia em que Newton dá créditos à outra pessoa. Continuar lendo

EvoluZoa

Há uma discussão meio cansativa (e inútil) sempre que uma obra literária é adaptada para o cinema: qual o melhor, o livro ou o filme? E, além de cansativa e inútil, é uma discussão baseada numa pergunta que não faz muito sentido, pois a literatura e o cinema são meios distintos, artes distintas, com características e propriedades diferentes. Há coisas que podem ser exploradas e transmitidas na literatura mas não no cinema, enquanto outras podem ser exploradas no cinema mas não na literatura. Continuar lendo

Drogas e literatura

Eu tenho certa aversão a polêmica e a confusão. Especialmente na atual era da internet, onde são tão comuns as agressões gratuitas e os comentários grosseiros, onde muitas pessoas não têm filtro algum para escrever ataques que seriam incapazes de dizer pessoalmente a seus interlocutores, e onde abunda a perigosa combinação de analfabetismo científico com presunção e grosseria, eu evito confusão a todo custo. Continuar lendo

Percepção e realidade

Uma palavra: umwelt.

Quando comecei a estudar etologia, há muitos anos, esse foi um dos conceitos que mais me marcou, e um dos que mais me fascina até hoje. De uma maneira extremamente resumida e simplória, umwelt é o mundo como ele é experimentado por um determinado organismo. Como é o mundo para uma gaivota? Como é o mundo para um carrapato? Como é o mundo para um besouro? Tente não cometer aqui um erro básico: quando Thomas Nagel perguntou “como é ser um morcego”, muita gente tentou imaginar como deve ser a experiência de uma mente humana tendo acesso ao mundo exterior através dos órgãos sensoriais de um morcego, ou, de forma mais simplificada, como seria se você transportasse magicamente uma mente humana para o corpo de um morcego. Mas não é isso que entendemos por umwelt: a umwelt do morcego, ou seja, “como é ser um morcego”, só pode ser corretamente compreendida quanto imaginamos de que forma a mente de um morcego (e não a de um ser humano), usando os órgãos sensoriais de um morcego, percebe o mundo, a realidade externa subjetiva. Continuar lendo

Enfim, meu livro!

Da concepção ao parto, passaram-se uns 60 meses. Não, não é um elefante nem uma baleia azul, animais cuja gestação dura bem menos tempo… é o meu livro, cuja nova edição, revisada e atualizada, acabou de ser publicada pela UnB!

capa unb

A primeira impressão do livro, que escrevi em 2009 em parceria com meu grande amigo Felipe Pessoa, na onda do bicentenário de Darwin, foi quase artesanal, com bem poucas cópias. Mas agora, publicado por uma grande editora, com certeza ele será mais facilmente encontrado em livrarias pelo país.

Enquanto isso, eis o link para o site da Editora UnB:
http://www.editora.unb.br/lstDetalhaProduto.aspx?pid=746

As modificações no texto original não são substanciais, e sim basicamente correções de erros relativamente comuns em uma impressão artesanal e amadora. Além disso, adicionei uma apêndice de leituras recomendadas, com indicações tanto de livros mais técnicos como de obras de divulgação científica, mais acessíveis ao público em geral.

A importância de ser herege

Eu tenho um curioso interesse, desprovido de quase qualquer utilidade, por etimologia e filologia. Se pararmos para pensar, há algumas semelhanças entre o par etimologia/filologia e a biologia evolutiva, quando se estuda origens comuns, padrões de divergência, semelhanças compartilhadas e outras coisas do tipo, como já escrevi aqui. Mas admito que, em grande parte, meu interesse por etimologia é apenas uma curiosidade, sem aplicações práticas, uma vez que a língua é viva, alvo de intermináveis vicissitudes. Por exemplo, de nada adianta saber que a palavra virtude significava originalmente “as qualidades positivas do sexo masculino”, ou num português direto “macheza”, “masculinidade”, “virilidade”, pois virtude vem do latim vir, que significa “homem”, “pessoa do sexo masculino”. Porém, posso usar a palavra virtude hoje em dia para descrever tanto homens como mulheres, uma vez que a sua origem etimológica não tem mais quase importância alguma para o sentido atual da palavra, a não ser que o meu interlocutor seja um professor de latim. Continuar lendo

Quando a democracia é inaceitável – o caso do movimento antivacinação

Dizem por aí que “para toda regra há uma exceção”. Sendo esse o caso, há regras sem exceção. A explicação é bem simples: o enunciado “para toda regra há uma exceção” é ele mesmo uma regra, e ele estipula que para toda regra – no caso ele próprio – há uma exceção. A conclusão é que há regras sem exceção. Do mesmo modo, eu costumava ouvir muito, nos meus tempos de professor, “sempre que um enunciado possuir a palavra sempre, ele está errado”. Ora, a conclusão disso é que há enunciados que possuem a palavra “sempre” e que estão corretos. Como distinguir o correto do errado? Não há uma fórmula, temos que analisar cada enunciado individualmente. Continuar lendo